Ontem
às onze
fumaste
um cigarro
encontrei-te
sentado
ficámos para perder
todos os teus eléctricos
os meus
estavam perdidos
por natureza própria
Andámos
dez quilómetros
a pé
ninguém nos viu passar
excepto
claro
os porteiros
é da natureza das coisas
ser-se visto
pelos porteiros
Olha
como só tu sabes olhar
a rua os costumes
O Público
o vinco das tuas calças
está cheio de frio
e há quatro mil pessoas interessadas
nisso
Não faz mal abracem-me
os teus olhos
de extremo a extremo azuis
vai ser assim durante muito tempo
decorrerão muitos séculos antes de nós
mas não te importes
não te importes
muito
nós só temos a ver
com o presente
perfeito
corsários de olhos de gato intransponível
maravilhados maravilhosos únicos
nem pretérito nem futuro tem
o estranho verbo nosso
Mário Cesariny
Pena Capital
Edição Assírio & Alvim
Imagem: Carla Salgueiro, Olhares
7 comentários:
Gostei dos corsários de olhos de gato intransponíveis. Como não amar estas palavras? Lindo...
" O vinco das tuas calças está frio".
Só ele mesmo...
Sabe bem fechar o dia com palavras destas.
Um beijo, fica bem
O inesquecível Mário Cerariny.
Belas palavras!
Grande abraço
Chegar aqui, pela manhã, e ter ...Cesariny...é um PRIVILÈGIO!
"brigados", Papagueno!!!!
Bjks
Ler Cesariny é sempre um enorme gosto num blog que gosto cada vez mais de visitar!
Beijinhos!
"decorrerão muitos séculos antes de nós"
...
"nem pretérito nem futuro tem
o estranho verbo nosso"
estas palavras sempre foram as minhas preferidas deste poema...*
ah, e a imagem é fabulosa...*
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