quarta-feira, 2 de abril de 2008

CONTOS DE FADAS


Felizes dos adultos que nunca deixaram morrer a criança dentro de si. Felizes dos adultos que ainda acreditam em fadas.

O PEIXE

Cá fora a tarde estava maravilhosa e fresca. A brisa dançava com as ervas dos campos. Ouviam-se pássaros a cantar. O ar parecia cheio de poeira de oiro.
Oriana foi pela floresta fora, correndo, dançando e voando, até chegar ao pé do rio. Era um rio pequenino e transparente, quase um regato; nas suas margens cresciam trevos, papoilas e margaridas. Oriana sentou-se entre as ervas e as flores a ver correr a água. De repente ouviu uma voz que a chamava:
- Oriana, Oriana.
A fada voltou-se e viu um peixe a saltar na areia.
- Salva-me, Oriana - gritava o peixe. - Dei um salto atrás de uma mosca e caí fora do rio.
Oriana agarrou no peixe e tornou a pô-lo na água.
- Obrigado, muito obrigado - disse o peixe, fazendo muitas mesuras. - Salvaste-me a vida e a vida de um peixe é uma vida deliciosa. Muito obrigado, Oriana. Se precisares de alguma coisa de mim lembra-te que eu estou sempre às tuas ordens.
- Obrigado - disse Oriana - agora não preciso de nada.
- Mas lembra-te da minha promessa. Nunca esquecerei que te devo a vida. Pede-me tudo o que quiseres. Sem ti eu morreria miseravelmente asfixiado entre os trevos e as margaridas.
A minha gratidão é eterna.
- Obrigado - disse a fada.
- Boa tarde, Oriana. Agora tenho de ir embora, mas quando quiseres vem ao rio e chama por mim.
E com muitas mesuras o peixe despediu-se da fada.
Oriana ficou a olhar para o peixe, muito divertida porque era um peixe muito pequenino, mas com um ar muito importante.
E quando assim estava a olhar para o peixe viu a sua cara reflectida na água. O reflexo subiu do do fundo do regato e veio ao seu encontro com um sorriso na boca encarnada. E Oriana viu os seus olhos azuis como safiras, os seus cabelos loiros como as searas, a sua pele branca como lírios e as suas asas cor do ar, claras e brilhantes.
- Mas que bonita que eu sou - disse ela. Sou linda. Nunca tinha pensado nisto. Nunca me tinha lembrado de me ver! Que grandes são os meus olhos, que fino que é o meu nariz, que doirados que são os meus cabelos! Os meus olhos brilham como estrelas azuis, o meu pescoço é alto e fino como uma torre. Que esquisita que a vida é! Se não fosse este peixe que saltou para fora da água para apanhar a mosca eu nunca me teria visto. As árvores, os animais e as flores viam-me e sabiam como sou bonita. Só eu é que nunca me via!

Excerto de "A Fada Oriana"
Sophia de Mello Breyner Andresen

8 comentários:

avelaneiraflorida disse...

EXCELENTE, AMIGO PAPAGUENO!!!!
EXCELENTE!!!!

Que não percamos a capacidade de sonhar e descobrir as fadas nos dias que correm!!!!
bjkas!!

Miguel disse...

Excelente Conto ...!

Um abraço da M&M & Cª!

Menina do Rio disse...

Um belo conto! Mas não deixa de ser uma verdade, pois somos o que mostramos aos olhos alheios. E se vêem a beleza é porque ela existe em cada um.

Um beijo

Anônimo disse...

Boa escolha para o dia de hoje...
Um Abraço

wind disse...

Excelente extracto que nos leva a reflectir.
Beijos

Anônimo disse...

algumas das obras que mais me inquietaram ou deliciaram são literatura para a infância.
As coisas que você nos recorda, Papagueno.
Obrigado

João Roque disse...

Delicioso conto de Sophia num campo um pouco diferente daquele a que nos habituou, mas sempre Sophia...
Abraço.

Maria Romeiras disse...

"Que esquisita a vida é..."

Lembrei-me deste dia mas não pude escrever, agora vejo, tantas crianças a falar em fadas, como é bonito. Acreditar.

Beijinho.